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sexta-feira, 17 de junho de 2011

Encontro reúne indígenas da Amazônia Brasileira no Alto Rio Negro

Álvaro Tukano (ao centro) entrega livro histórico para sec. Bonifácio José. Foto: Isaac Júnior

Com apoio do Governo do Amazonas, por meio da Secretaria de Estado para os Povos Indígenas (Seind), começa neste sábado (18) e vai até a próxima terça-feira (21), em São Gabriel da Cachoeira (a 858 quilômetros de Manaus), o encontro “Diálogo entre Lideranças do Movimento Indígena da Amazônia Brasileira”.

A proposta é fazer uma avaliação criteriosa desse movimento na região, refletir sobre as conquistas e dificuldades e identificar as diretrizes estratégicas para a ação política dos povos, definida durante a última Assembleia Geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), ocorrida em 2009, no Maranhão.

Oitenta lideranças de nove estados da Amazônia confirmaram participação no evento, que é organizado pela Coiab e a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn). As duas organizações estão entre as principais referências de legitimidade do Movimento Indígena no Brasil. Ao final das discussões, será produzido um documento com as estratégias de atuação política em relação aos principais temas enfrentados, com base na luta pela garantia dos direitos e interesses dos povos indígenas. 

Evolução da política governamental 
A Seind vai aproveitar o debate para falar sobre a evolução histórica da política pública desenvolvida pelo Governo do Estado junto aos indígenas desde 2001, com a criação da Fundação Estadual dos Povos Indígenas (já extinta) e, posteriormente, da Seind, a partir de setembro de 2009.

Amparada pela Constituição de 1988, essa política possibilitou a criação do programa Amazonas Indígena (inserido no programa Zona Franca Verde), com ênfase no etnodesenvolvimento, na valorização da cultura, direito, atenção social e fortalecimento das organizações indígenas.

“Esse modelo atual de organização nos possibilitou garantir segurança alimentar, geração de renda, direitos à cidadania, conservação e uso sustentável dos recursos naturais, preservação, reconhecimento e valorização dos povos indígenas”, destaca o secretário da Seind, Bonifácio José Baniwa.

“Como proposta para um novo modelo de organização, apresentamos as parcerias com instituições de ensino que possibilitem o uso do conhecimento e de técnicas tradicionais e de recursos naturais, de forma racional, combinado com a tecnologia moderna, respeitando a decisão de cada povo em relação aos projetos que queiram desenvolver em suas terras”, acrescenta.

Além da Seind, apoiam o evento na região do rio Negro, a GIZ (agência alemã de cooperação Internacional), Prefeitura Municipal de São Gabriel da Cachoeira, Fundação Nacional do Índio (Funai), Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), Fundação Amazônia Sustentável, Prefeitura Municipal de Barreirinha e Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Alto Rio Negro. 

Liderança Tukano visita Seind 
Um dos líderes indígenas convidados e que vão estar no encontro é Álvaro Tukano. Nascido na aldeia São Francisco, em São Gabriel da Cachoeira, ele esteve nesta sexta-feira (17), na Seind, e foi recebido pelo secretário Bonifácio.

Membro da Foirn, Álvaro é uma das pessoas que começaram o processo de luta dos indígenas, em níveis nacional e internacional, entre as décadas de 70 e 80. Depois de tantos anos, ele diz que os povos começam a colher o que foi plantado, e que o encontro no rio Negro vem para confirmar isso.

Ele destaca que o momento é de reflexão sobre o Movimento Indígena, que precisa se fortalecer, ante a posição de terceiros que querem tomar decisões pelos índios. “Quando os brasileiros não falam com voz própria, quando são muito globalizados, para mim soa diferente, por isso temos que centralizar as forças para defender a Amazônia, que tem 71 índios isolados, desses 31 são confirmados e outros estão em fase de estudo”, observou. “Apesar de não conhecê-los pessoalmente é obrigação, do movimento, defender esses povos, porque esse tipo de qualidade de vida no mundo, só nós temos”, destacou.

O líder indígena lembrou que, para a região do rio Negro ter se transformado num dos focos pioneiros do Movimento Indígena no Amazonas, muitas pessoas foram assassinadas ou esquecidas. Essas experiências vão ser mostradas durante o encontro, além de um debate amplo sobre questões como a mineração em terras indígenas, saúde, educação e preservação. “Não estão sabendo valorizar uma das maiores riquezas que a Amazônia tem, que são os conhecimentos tradicionais”, criticou Álvaro Tukano. “Nós prestamos um grande serviço ambiental para o Brasil e a humanidade e os outros países tem que aprender conosco que temos tudo de graça: água, floresta...”, enumerou. 

Entraves 
Ao falar de mineração, Álvaro se referiu a uma das principais bandeiras de luta dos indígenas e que o Governo do Estado tem procurado ajudar no debate, para que, finalmente, seja regulamentado no Congresso Nacional. O entrave ainda existe em Brasília e impede que projetos como o Lapidart – desenvolvido pela Seind, em parceria com a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia (Sect) – sejam executados. “Os governantes vão ter que sentar conosco em relação a essa pauta, não podemos ser índios ‘pintadinhos’ para gringo ver, servir de fantasia para muita gente que só tem a teoria de preservação”, disparou. “Os índios continuam defendendo a floresta em pé, enquanto os gringos devastaram por lá e agora querem ensinar o índio a viver. Não podemos aceitar isso”, finalizou. 

Livro 
O indígena aproveitou a visita à Seind para divulgar o livro “Doéthiro (Irmão Maior) – Álvaro Tukano e os Séculos Indígenas no Brasil”. A produção é de 2010, mas ainda não foi lançada oficialmente, segundo o autor, que pretende levar o trabalho também às universidades brasileiras. “É um relatório de uma viagem que fiz pelo Brasil”, destacou. “Precisamos reeducar nossa juventude”, acrescentou o indígena, que é um dos fundadores da Foirn.

A obra tem 176 páginas e traz relatos da vida nas aldeias, seus conflitos de ordem política, suas carências em relação à posse da terra, à saúde, à educação e às conquistas de lugar e identidade. 

Números 
De acordo com dados divulgados pela Coiab, que é uma organização indígena de direito privado e sem fins lucrativos criada em 19 de abril de 1989, a Amazônia Brasileira tem uma extensão de 5,2 milhões de quilômetros quadrados, dos quais, 1,08 milhão pertence a 430 terras indígenas, que corresponde a 110 milhões de hectares, equivalentes a 60% da população indígena nacional.

Estima-se que mais de 440 mil indígenas vivem na Floresta Amazônica, num total de 180 povos que falam 160 línguas e dos quais 66 vivem de forma livre e autônoma, sem contato com a população envolvente.

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