Debate que resultou na criação do sistema reuniu um bom público no alto rio Negro. Todos tiveram a oportunidade de expor ideias e opiniões. Fotos: Bonifácio José Baniwa |
Empenhadas em garantir identidade indígena no desenvolvimento regional sustentável, com o apoio do Governo do Amazonas, lideranças indígenas do rio Negro decidiram criar um sistema de sustentabilidade socioeconômico e cultural para aquela região do estado. O objetivo é buscar receitas e fazer o gerenciamento dos recursos para potencializar, entre outras propostas, as produções indígenas nas áreas da biotecnologia, agrobiodiversidade, agroflorestal, do ecoturismo, mineração (com exceção da Terra Indígena Yanomami), cosméticos, artesanatos, plantas medicinais, na criação de animais de pequeno porte (piscicultura, aves, suínos e outros), no pagamento de serviços ambientais e contribuição dos profissionais indígenas.
O processo de implementação, execução e viabilização do sistema deverá ser feito pela Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn). A entidade deverá iniciar uma ampla campanha de mobilização e esclarecimento junto às organizações e associações de base, para que, em conjunto, todas possam entender e atender às demandas das comunidades.
A proposta foi apresentada durante o encerramento do 1º Encontro de Lideranças dos Povos Indígenas do Rio Negro, realizado entre os dias 7 e 9 deste mês, em São Gabriel da Cachoeira (a 858 quilômetros de Manaus).
André Baniwa (de vermelho) registrou as propostas definidas no evento |
Na ocasião, as lideranças discutiram a trajetória, a história e as perspectivas futuras para o movimento indígena do rio Negro, agregando conhecimento técnico e científico ao desenvolvimento econômico e geração de renda para mais de 700 comunidades.
O evento teve a participação do titular da Secretaria de Estado para os Povos Indígenas (Seind), Bonifácio José Baniwa, e representantes de 23 povos, que falam quatro línguas diferentes (Aruak, Maku, Yanomami e Tukano Oriental) e são habitantes milenares do noroeste amazônico, mais precisamente da região também conhecida como “Cabeça do Cachorro”.
Economia
Como resultado do trabalho de três dias de análise e avaliação, ficou constatado que os povos indígenas não têm mais como viver da economia de subsistência. A partir do encontro, tanto a Foirn quanto as organizações e suas lideranças irão trabalhar a economia de mercado, com base no uso e extração dos recursos naturais existentes nas terras indígenas. “O encontro foi bom e, no final, todos assinaram um compromisso de fazer valer os direitos do nosso povo, com autonomia, por meio das organizações e lideranças”, informou Bonifácio José.
Indígenas mostram algumas dessas propostas, feitas entre os próprios participantes |
Para viabilizar a criação do “Sistema de Sustentabilidade do Rio Negro”, os indígenas concluíram que será necessária a formação de cooperativas indígenas de abastecimento, empresas e fábricas indígenas, um fundo para a captação de recursos e a criação de uma política específica.
O trabalho de implementação das propostas e a criação do sistema de sustentabilidade terá o acompanhamento de uma equipe formada pelas seguintes lideranças: André Baniwa, Pedro Machado, Bráz França, Renato Matos, Gilda da Silva Barreto, Jorge Pereira, Marivelton Rodrigues, Afonso Machado, Nivaldo Castilho, Domingos Barreto e Valdir Yanomami. “Decidimos o futuro do nosso povo, da terra e do nosso município, que é formado majoritariamente por indígenas”, disse o secretário da Seind.
Capacitação
A formação e a capacitação também vão ser fundamentais para a implementação dessa política. Já está prevista a realização de cursos, seminários, oficinas e palestras sobre empreendedorismo; formação nas áreas do conhecimento científico, que possam viabilizar o sistema de sustentabilidade; capacitação para a realização de pesquisas de mercado, marketing e publicidade.
Proteção
Outra proposta apresentada pelos indígenas é a necessidade de se elaborar um termo de ajustamento de conduta e normatização das atividades, com vistas à proteção do conhecimento tradicional, ao combate à biopirataria e proteção do conhecimento material e imaterial, associados a recursos genéticos dos povos indígenas do Rio Negro, de interesse econômico e propriedade intelectual.
O modelo de trabalho nas comunidades dos povos indígenas do Rio Negro deverá seguir a metodologia baseada no modelo familiar de produção das comunidades indígenas respeitando-se os clãs e grupos de parentesco em suas demandas e expectativas.
Sistema monetário
Entre as outras instituições que deverão ser acionadas para ajudar a Foirn na ação estão a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto Socioambiental (ISA), universidades e outros, que já trabalham com programas na área indígena.
Todo o sistema deverá considerar as perspectivas e demandas indígenas, inclusive com a formulação de um sistema monetário específico e local, garantindo assim a autonomia e autodeterminação dos povos indígenas do Rio Negro. O lucro advindo do sistema de sustentabilidade econômica deverá ser revertido em desenvolvimento social e cultural dos povos indígenas do Rio Negro, garantindo a preservação dos recursos naturais para as atuais e futuras gerações, cumprindo assim a função social das terras indígenas do Rio Negro.
Ao final, um registro em grande estilo da participação de todos no evento |
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